Unreal city under the brown fog of a winter afternoon
The Waste Land, T. S. Eliot
No será irreal, ni tendrá,
como la otra, un Támesis que la bañe,
pero su río, de estuario tan amplio como
el cielo, no deja de ser bello.
Es, a veces, de mucho más turbadora nitidez
que aquella que arrima su piel
a las márgenes
de otros ríos (el que inspiró de ninfas
al poeta inglés, o el que de rubias
guerreras al músico alemán).
Por aquí, desde hermoso a creador de algún
deseo ardiente,
de todo le han llamado.
Y la ciudad que, en época ignorante de proteica
explosión, le heredó el agua,
la leyenda, las carabelas,
de él heredó otras cosas:
anhelos de volar miles de rimas,
tantas gentes diversas y noches inmensas,
o una luna tan grande y desviada
de su ruta amena.
Ni Jerusalén ciega por un hombre
que, al romper el siglo,
de ella habló, como habló de Londres, de Viena,
de Alejandría o de otras,
ay, dulce, corre ahora, till I end my song
till I end my song, my song, my
song…
Era el verso de Spenser que ahora aquí
cabía, original,
en una ciudad ni siquiera irreal,
sino de un azul tan grande, de fachadas
tan lacia en las ventanas, y de una tristeza
tan revisitada,
que en ella la de los jacintos debería
reconocerse: You,
hipocrite lecteur, mon semblable, mon frère.
Y el resto: una canción
inacabada.
☛ Ana Luísa Amaral. De Lisboa: uma canção inacabada com revisitação e Tejo ao fundo (poemsfromtheportuguese.org)
Trad. E. Gutiérrez Miranda 2022
∼
De Lisboa: uma canção inacabada com revisitação e Tejo ao fundo
Unreal city under the brown fog of a winter afternoon
The Waste Land, T.S. Eliot
Não será irreal, nem terá,
como a outra, um Tamisa a banhá-la,
mas o seu rio, de estuário tão largo como
o céu, não deixa de ser belo
É, por vezes, de muito mais pungente nitidez
do que aquela que encosta a sua pele
às margens
de outros rios (o que inspirou em ninfas
o poeta inglês, ou em louras
guerreiras o músico alemão)
Por aqui, desde fermoso a criador de tal
desejo ardente,
tudo lhe chamaram.
E a cidade que, em momento ignorante de proteica
explosão, lhe herdou a água,
a lenda, as caravelas,
dele herdou outras coisas:
desejos de voar milhares de rimas,
de gentes tão diversas e de noites imensas,
de uma lua tão grande e desviada
da sua rota amena
Nem Jerusalém cega por um homem
que, no rasgar do século,
dela falou, como falou de Londres, de Viena,
de Alexandria ou outras,
ah, doce, corre agora, till I end my song
till I end my song, my song, my
song
Era o verso de Spenser que agora aqui
cabia, original,
numa cidade que nem de irreal,
mas de um azul tão grande, de fachadas
tão renda nas janelas, e de uma mágoa
tão revisitada,
que aquela dos jacintos haveria
de se reconhecer: You,
hipocrite lecteur, mon semblable, mon frère
E o resto: uma canção
inacabada —
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