31 de mayo de 2021

Ana Luísa Amaral

Oda a la diferencia


Felizmente.
Todos somos diferentes. Tenemos todos
nuestro espacio propio de cosillas
propias, como narices y manías,
bocas, sueños, ojos que ven cielos
en daltonismos propios. Felizmente.
Si no el mundo sería una enorme pompa
de jabón con todos nosotros allí dentro
burbujeando, todos iguales en soplo:
pequeñas erupciones de cráteres iguales.
Así pues y felizmente todos somos
diferentes. Si no la terapia
de grupo sería un éxito y lo que es cierto
es que somos más felices explorando
en solitario nuestro propio espacio
de manías, de traumas, de uñas de los pies
infravaloradas por nuestra cultura
(que allá en Oriente el pie es algo serio,
motivo sensual y exploratorio).
Empieza así: el mundo di-
vidido por ritmos atávicos
—y otras cosas nimias como guerras
o hambrunas (Nótese: la criatura
es escéptica y tiene un gusto pésimo,
pero véanse otros textos que redimen
en serio lo que dice aquí. Cfr. p. ej.
lo que se quiera, pero dejen que la criatura
se dé un capricho por si pensase —pobrecita—
incómoda y ruidosa). Prueba evidente
de que somos diferentes, felizmente.
Empieza así: en el mundo divi-
dido; y continúa en razas y
raíces. Nosotros somos portugueses,
tan felices, con tanta historia detrás
y tantos hechos, tantas cosillas propias
para el deleite: el mar que nos engendró,
y todo lo demás, son pompas pequeñitas
de jabón atestiguando la diferencia
con nuestro hermano de al lado, ese infeliz
lleno de represiones de tradiciones y lenguas,
paella y calamares. Tiene boca como
nosotros: no canta el fado. Tiene piernas como
nosotros: no baila el vira. Se contenta
—pobrecito— con flamencos llorados
y palmas doloridas. Todos somos
diferentes, felizmente (Nótese:
[si su paciencia todavía no
ha huido despavorida —es sin de,
pero ella insiste en respetar
el ritmo—]: esto que la criatura
repite y reafirma, de vez en cuando,
no debe ser tomado a la ligera
como señal senil [¡ha aliterado!],
sino como tentativa suicida
de ofrecer unidad a lo que no la tiene,
moralizar el texto poco a poco,
darle una idea igual, ser un lema
formal que contrarreste la prueba
evidente esa. Que de diferencias
estamos todos llenos y esto
pretendía ser una oda y no lo ha sido).
Felizmente.


Ana Luísa Amaral. Ode à diferença (joaquimalexandrerodrigues.blogspot.com)
La portuguesa Ana Luísa Amaral gana el XXX Premio Reina Sofía de Poesía Iberoamericana (elcultural.com)
Trad. E. Gutiérrez Miranda 2021


                    ∼

Ode à diferença

Felizmente.
Somos todos diferentes. Temos todos
o nosso espaço próprio de coisinhas
próprias, como narizes e manias,
bocas, sonhos, olhos que vêem céus
em daltonismos próprios. Felizmente.
Se não o mundo era uma bola enorme
de sabão e nós todos lá dentro
a borbulhar, todos iguais em sopro:
pequenas explosões de crateras iguais.
Assim e felizmente somos todos
diferentes. Se não a terapia
em grupo era um sucesso e o que é certo
é sermos mais felizes a explorar
solitários o nosso próprio espaço
de manias, de traumas, de unhas dos pés
invaloradas pela nossa cultura
(que lá no Oriente o pé é o caso sério,
motivo sensual e explorativo).
Começa por aí: o mundo di-
vidido por atávicos ritmos
— e outras coisas somenos como guerras
ou fomes (Note Bem: a criatura
é céptica e tem um gosto péssimo,
mas veja-se outros textos que redimem
em sério o que aqui diz. Cf. por ex.
o que quiser, mas deixe a criatura
regalar-se por se pensar — coitada —
incómoda e sonora). Prova evidente
de que somos diferentes, felizmente.
Começa por aí: no mundo divi-
dido — e continua em raças e
raízes. Nós somos portugueses,
tão felizes, com tanta história atrás
e tantos feitos, tantas coisinhas próprias
de delícia: o mar que nos gerou,
e o resto tudo, são bolas pequeninas
de sabão a atestar da diferença
do nosso irmão do lado, esse infeliz
cheio de recalques de tradições e línguas,
paella e calamares. Tem boca como
nós: não canta o fado. Tem pernas como
nós: não dança o vira. Contenta-se
— coitado — com flamencos chorados
e falanges doridas. Somos todos
diferentes, felizmente (Note Bem:
[se a sua paciência ainda não
fugiu despavorida — é sem dê,
mas ela insiste em respeitar
o ritmo —]: isto que a criatura
repete e reafirma, quando em quando,
não deve ser tomado em ligeireza
como sinal senil [aliterou!],
mas como tentativa suicida
de oferecer unidade ao que o não tem,
moralizar o texto a pouco e pouco,
dar-lhe uma ideia igual, ser um mote
formal a contrabalançar a tal
prova evidente. Que de diferenças
estamos todos cheios e isto
pretendia-se uma ode e não foi).
Felizmente.



☛ PyoZ ☚